
As últimas semanas têm sido muito, muito difíceis. Eu torci muito para que dezembro chegasse logo, porque eu queria poder ver as pessoas que gosto, matar a saudade dos poucos membros da minha família a quem eu amo, e acima de tudo eu queria ver as
luzes pela cidade - porque Dezembro é sinônimo de luzes, amor e carinho pra mim, e eu sempre me sinto melhor ao andar pela cidade iluminada ao final do ano (mesmo odiando o verão com todas as minhas forças).
No final de semana, véspera do feriado, eu e minha mãe fomos assaltadas na porta da estação da luz. Foi levada uma correntinha de ouro - que tinha dois pingentes que meu pai deu a ela quando eu e meu irmão nascemos, além de um crucifixo que ele usava. Minha mãe ficou arranhada, e ver o sangue no colo dela em tempos de covid me deixou um pouco em pânico. Desde então não tenho mais vontade - nem coragem - de sair de casa.
No final de semana seguinte, a notícia de que a mãe do melhor amigo do meu pai havia falecido. Resolvemos ir ao velório, mas não ficamos para o funeral. A última vez que havia pisado naquele mesmo cemitério foi 4 anos antes, quando me despedi do meu próprio pai pela última vez. Que a Dona Germínia, minha vózinha adotiva, esteja em paz. Queria tê-la visto uma última vez.
No mesmo dia, mais para o final da tarde, a notícia de que um dos irmãos da minha mãe caiu de uma escada e quebrou o calcanhar. Uma pessoa muito boa, dócil, que sempre se doa ao máximo para ajudar os seus, aos trancos e barrancos. Precisa fazer uma cirurgia, e nunca mais vai poder caminhar e fazer esforço normalmente, em função da fratura. O corpo não vai poder mais sustentar o peso por muito tempo, e ele vai conviver com muitas dores até o fim da vida. Minha mãe ficou desolada.
Na quinta-feira, depois do feriado, e antes destes acontecimentos, minha avó foi internada no hospital. Minha avó que ajudou a me criar, que é uma das poucas pessoas por quem eu acho que faria de quase tudo na vida. A avó que eu visitava toda semana, que foi em eventos de anime comigo, que me apoiou quando passei numa universidade fora da capital quando mais ninguém - nem mesmo meus pais - me apoiava. A pessoa que me recebeu em sua casa quando eu não fui bem-vinda na minha, que me contou histórias durante a infância, adolescência e vida adulta.
Minha avó segue viva, mas não sabemos por quanto tempo. E enquanto todos estamos acompanhando as idas aos médicos e especialistas, os exames, a enxurrada de medicações e cuidados, ver minha avó ativa, animada e inquieta com medo de viver a vida, por não saber quando o coração vai desistir dela, me apavora. A uma semana do aniversário de 4 anos da morte do meu pai, é difícil digerir que, de repente, minha avó não pode estar mais comigo, mais rápido do que eu esperava. Que talvez não dê tempo de apresentá-la aos bisnetos. Ou de entrar na igreja sobre o olhar feliz e orgulhoso dela. Ou de chamá-la para almoçar na minha primeira casa própria. Ou levá-la pra passear de carro quando eu enfim tirar minha habilitação. É assustador ter que me deparar com a finitude quando eu acabei de entrar em termos com o Adeus do meu pai, filho dela, que também se foi sem que eu pudesse viver tudo o que eu queria com ele.
Temos variante nova. A economia não se preocupa com a infinitude da pandemia, o mundo padece mais e mais a cada dia com as consequências de um desgoverno em alta velocidade pelas trilhas do Brasil, e a tristeza:
não tem luzes em São Paulo. Não tem luzes nas casas, não tem calor, não tem segurança e boas lembranças. Não tem cheiro de ceia, não tem vínculo nem vontade de viver. Não tem saúde, nem educação, nem segurança, nem alimento - nem pro corpo, nem pra alma. E a pandemia vem com mais uma carta na manga, mais uma vez.
Eu quero muito acreditar em dias de sol, e que a vida vai encontrar um caminho. Eu quero. Mas está difícil.
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