A.,
Eu acho a sua melhor amiga insuportável, hahaha! Nunca te disse isso, nem vou dizer, porque você certamente não lerá essa carta, nem temos mais essa intimidade. Eu decidi me afastar de você porque, quando meu pai morreu, você foi infinitamente insensível - eu não vou esquecer nunca de estar deitada no meu quarto, no escuro, 15 dias depois da morte de uma das pessoas que mais importavam na minha vida, e você me perguntou como eu estava por mensagem. Eu respondi algo bem específico, do tipo, "péssima mas isso já é esperado", e perguntei "e você?"
E você prosseguiu em me dizer o quanto você estava ótimo, porque você havia passado um final de semana maravilhoso com seus amigos na piscina e feito ensaios fotográgicos, e foi completamente maravilhoso, e me enviou cerca de umas 20 fotos de você e seus amigos festejando e fazendo caras de bocas para a câmera.
E isso foi de uma insensibilidade tamanha, sabe? Porque quando meu pai morreu, eu liguei pra você. Eu chorei pra você na madrugada, falando do quanto eu estava revoltada, desolada, triste, do quanto eu não sabia mais o que esperar da vida naquele ponto em diante. Enfim, eu esperava mais sensibilidade, e eu sinceramente não acho que era esperar demais naquele momento. Mas me senti vingada, porque falei disso com uma amiga em comum - a quem eu pedi desculpas por ter criticado, muito influenciada pelo seu olhar, porque quando ela vivenciou o luto ela estava "se isolando de nós, amigos dela". Pois você teve a audácia de dizer logo pra ela que lidava muito bem com o luto e ela, sabendo da experiência que eu tive contigo e tendo vivenciado a mesma coisa, te disse na sua cara que na verdade você não era nada acolhedor. E não era mesmo.
Desse ponto em diante senti que nossa amizade foi ladeira abaixo. Era uma insensibilidade atrás da outra e, putz, eu me sentia tão conectada a você. Você era a única pessoa que fazia questão de me ligar no meu aniversário e celebrar isso publicamente, e eu me sentia muito querida. Mas daí você também tinha seus próprios monstros dentro do armário, e quando você falava uma coisa e fazia outra, me ofendia muito. Daí o que antes me incomodava porque eram insensibilidades diretamente comigo, se tornaram incômodos com como você tratava as outras pessoas, com como você lidava com outras situações, e eu... Bom, me afastei, como eu sempre faço.
E hoje eu sei que isso te magoou muito. Eu sinceramente não esperava, porque você sempre exibe tanto as suas múltiplas e incríveis amizades, que eu não achei de verdade que eu faria falta. Eu não achei de verdade que aquela única vez que você chorou no meu colo, na minha casa, foi tão importante pra você. Eu de verdade não me acho muito importante, e achei que logo você me esqueceria e tal. Porque eu não queria te dizer o quão cruel e insensível você estava sendo comigo, o quão hipócrita e tóxico você estava sendo com seu ex, e eu evito conflitos sempre que eu posso, né? Você sabe disso.
Mas acho que "voltar" a falar contigo em rede social me fez perceber que quando uma relação se desfaz, ela nunca volta a ser o que era. Eu sinto que eu te mandar mensagem ou não faz zero diferença na sua vida, embora você tenha me dito que estava muito feliz em eu ter te mandado aquele "oi" por mensnagem. E aí eu só fico vendo você sendo aparentemente a exata mesma pessoa, e não sei mais dizer se os vídeos que você me manda no instagram te fizeram pensar em mim porque você me vê neles, se você está me dando uma indireta, se você mandou pra pessoa errada, sinceramente. E aí eu te vejo celebrando horrores aquele grupo de amigas que eu acho sinceramente insuportáveis, em especial aquela sua melhor amiga que tem uma cara tão plastificada que eu passei umas horas da minha vida olhando fotos dela tentando entender se ela fez plástica no nariz ou não. E aí eu me lembro que você falava de mim com tanto carinho, sobre o quão parecidos nos éramos, sobre a nossa conexão e eu só consigo pensar: meu deus do céu, será que eu sou parecida com a patuto? Deus me livre, que morte horrível.
Nossa amizade foi boa enquanto durou e eu tenho muita saudade dos dias em Assis, de você em casa, de cozinharmos juntos e falarmos mal das pessoas chatas da faculdade. Mas às vezes eu vejo a sua persona de redes sociais - que é tudo ao que tenho acesso hoje, por culpa e escolha minha - e acho que, é. Foi em tempo, foi com Deus e vida que segue.
Sem ressentimentos, porque né, quem sou eu pra te ressentir por eu ter mudado. Perder as pessoas que a gente ama muda muita coisa na nossa cabeça, e eu espero que você não passe por isso tão cedo.
Sem rancor nenhum, eu juro,
B.
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